Por Monica Pessoa, fundadora e presidente da Associação Brasileira de Degustadores
de Queijos (ABDQ), especializada em análise sensorial. Mora em Bordeaux e atua em
turismo gastronômico na França.
O queijo, um dos símbolos da gastronomia francesa
Uma diversidade enorme, com as suas formas, cores, sabores, gostos, aromas e
texturas. Mas não é só a França que se faz bons queijos. Temos queijos maravilhosos
em torno do mundo.
Existem mais de mil variedades de queijos. Essas variedades são agrupadas em oito
famílias, de acordo com o teor de água, gordura e cálcio. Além da textura, distinguimos
também pelo tipo de leite (vaca, cabra, ovelha, búfala, camelo ou jumenta). Para
melhor compreender, vamos partir por esse mundo de texturas e conhecer as oito
famílias.
Queijos frescos
Eles podem ser fabricados a partir do leite de vaca, cabra, ovelha, desnatados ou mais
rico em creme. Estes queijos têm um teor elevado de água, pois são dessorados
lentamente e naturalmente. Alguns são enformados e outros, não. O importante é que
eles não são maturados.
São queijos muito úmidos, de sabor leve, fresco e ligeiramente ácido Nesta primeira
família, podemos citar Fromage Blanc, Ricota, Cottage, Minas Frescal.
Principais características
Casca: nenhuma.
Massa: branca e úmida.
Aroma: lático, creme.
Aromas: associados ao salgado ou ao doce.
Queijos de massa mole, mofo branco, croûte fleurie ou natural lavada
Os queijos desta família são cuidadosamente maturados. Eles são feitos a partir da
coalhada por coagulação lática ou enzimática, e esta coalhada não é prensada nem
cozida. A casca é branca e a massa, macia e suave.
O termo croûte fleurie é usado quando o queijo, logo depois de desenformado, é
pulverizado por um líquido contendo um fungo (Penicillium candidum). E a película
branca na sua casca, que aparece ao longo dos dias, é chamada de “flor”. Exemplos:
Brie, Brillat Savarin, Coulommiers.
Principais características
Casca: branca, macia, leve.
Massa: flexível, suave, cremosa ou até mesmo “escorrendo”.
Aromas: fermento, cogumelo, terra úmida, vegetação rasteira, musgo.
Sabores: avelã, manteiga, creme, cogumelo.
Queijos de massa mole, casca natural lavada
A produção desses queijos é a mesma que a dos de mofo branco. Durante o período
de maturação, os queijos serão lavados e escovados várias vezes com salmoura (água
salgada), à qual, às vezes, é adicionado álcool (Marc de Bourgogne para Epoisses, por
exemplo). Esses queijos são famosos pelo seu cheiro forte e a sua casca úmida,
geralmente de cor laranja. Por exemplo, encontramos Epoisses, Maroilles e Pont
Evêque.
Principais características
Casca: vermelho-alaranjada, úmida, pegajosa.
Massa: flexível, suave, cremosa ou até mesmo “escorrendo”.
Aromas: macerado, amônia, penetrante.
Sabores: frutado, franco, distinto, terroir.
Queijos de massa prensada não cozida
É a família mais atípica! Existem queijos feitos de todas as texturas, cores, pequenas e
grandes (de 500 g a mais de 40 kg). O ponto em comum: a coalhada, que não deve ser
aquecida a uma temperatura igual ou superior a 50 °C, é pressionada para remover o
soro de leite. A prensagem pode ser feita antes ou depois da moldagem.
Este método de fabricação permite que os queijos sejam armazenados por mais
tempo. A sua crosta, mais ou menos grossa, pode ser lavada ou natural. Muitas vezes,
é ela quem traz todos os aromas.
O amadurecimento desses queijos, que geralmente dura de dois meses até mais de um
ano, ocorre em uma cave de maturação úmida e fresca. Exemplos: Cantal, Chevrotin,
Laguiole, Mimolette, Trappe Échourgnac (o qual aprecio muito) e muitos outros.
Principais características
Casca: variada.
Massa: variada.
Aromas: uma enormidade.
Sabores: uma enormidade.
Queijo de massa prensada cozida (massa dura)
Alguns queijos desta família têm a forma muito grande, pesando mais de 100 kg!
Também são chamados de "massa dura”. A grande maioria das massas prensadas
cozidas é feita com leite de vaca. A coalhada é gradualmente aquecida a uma
temperatura de 57 °C, geralmente em grandes cubas de cobre. Ele será fabricado
permanentemente no local para separar a parte sólida e a parte líquida.
Os grãos de coalhada obtidos são fortemente pressionados por longas horas. O
aquecimento poderoso e a prensagem intensa tornam possível eliminar o soro de leite
o máximo possível (extrato seco mais importante) e, assim, obter queijos que duram
mais tempo.
A massa de alguns desses queijos é pontilhada com orifícios de tamanhos variados. São
causadas pelo CO2 difundido durante o amadurecimento pelos microrganismos
presentes na massa. Quanto mais quente a adega, mais numerosos e grandes serão as
olhaduras!
Cuidados regulares são dados aos queijos durante a sua maturação, que pode durar de
seis meses a vários anos: lavar, escovar, virar.
Esses são queijos conhecidos pelos seus aromas frutados. São tradicionalmente feitos
nas montanhas nos meses de verão, quando o leite é rico e abundante.
Nesta família, também estão classificados como queijos prensados, conhecidos como
semicozidos, porque as suas coalhadas são aquecidas, mas a uma temperatura mais
baixa. Exemplos: Abondance, Comté, Emmental, Gruyère, Pecorino.
Principais características
Casca: cor dura e variável.
Massa: lisa, macia ou firme, às vezes pontilhada de orifícios.
Aromas: flora, leite, açúcar.
Sabores: frutado, florido, leitoso, leve amargura.
Queijos de mofo azul (patês persillés)
Essa família de queijos não deixa indiferente! Esses queijos são chamados de queijos
de mofo azul ou mofo interno. Podem ser feitos de leite de vaca, como o Gorgonzola,
de ovelha como o Roquefort, e, mais raramente, de cabra. Têm uma coloração de
veias ou marmóreo verde, azul ou cinza.
São feitos como outros queijos, mas tem a distinção se ser introduzido na sua massa
um fungo da família das penicilinas, como Penicillium glaucoma ou Penicillium
roquefort.
Para se desenvolverem, os fungos precisam de oxigênio, e, para isso, os queijos são
amadurecidos em caves ventiladas e são furados regularmente com agulhas finas e
longas, manual ou mecanicamente, para deixar entrar o ar. Esses queijos são os únicos
que amadurecem de dentro para fora.
Ao contrário do que as pessoas pensam, a massa marmorizada nem sempre significa
um queijo forte. É um queijo de sabor metálico, mas, com a maturação, vai ficando
mais adocicado. Exemplos: Roquefort, Gorgonzola, Stilton, Bleu d’Auvergne.
Principais características
Casca: fina e de cor variável.
Massa: macia a firme, pontilhada.
Aroma: cogumelo, leite, cave.
Sabor: cogumelo, frutado, creme, metálico leve a acentuado, leve amargor.
Queijos de massa filada
A família menos francesa! O massa filada é obtido a partir do resultado de um leite
muito coalhado e cortado em pedaços. Os pedaços de coalhada são imersos em água
fervente e vigorosamente agitados, até que seja obtido um “fio” mais ou menos longo,
grosso e derretido.
Massas filadas podem ser consumidas frescas ou maturadas. É uma especialidade
italiana. A mais conhecida dessa família é a muçarela feita com leite de vaca ou de
búfala. Exemplos: Mozzarella, Burrata, Provolone, Caciocavallo, Stracciatella.
Principais características
Casca: fina e ou apenas cremosa, como o caso da Stracciatella; cor variável.
Massa: filada elástica ou cremosa.
Aroma: crème, fresco ou defumado.
Sabor: leve, untuoso, leitoso, às vezes doce e levemente ácido, defumado. Todos esses
sabores dependem do tipo de queijo de massa filada.
Queijos fundidos ou processados
Os queijos processados resultam, na maioria dos casos, do derretimento de queijos
prensados cozidos (Emmental, Comté, Gouda…), ou mesmo a partir de queijos frescos.
Este tipo de queijo é obtido por fusão de queijo ou de uma mistura de queijos. Ervas,
especiarias ou outros tipos de produtos lácteos podem ser adicionados à sua
preparação. Podem ser cremes, queijos para barrar, queijos de aperitivo, etc. A
maioria tem o nome de uma marca registrada por uma empresa. Exemplos: Cream
Cheese, La Vache Qui Rit, Kiri, Fondue.
Principais características
Casca: não apresenta.
Enorme variedade de sabores, aromas e texturas.
Queijos de ovelha
Com vários séculos de idade, os queijos de leite de ovelha provêm de uma cultura
típica de queijos. Eles são projetados e preservados em ambientes específicos e são,
para algumas regiões, um símbolo e um sucesso vinculados à sua cultura.
Esses queijos são todos baseados no antigo savoir-faire (know-how) local e diferem de
acordo com a região francesa ou estrangeira onde foram produzidos. Os mais
conhecidos são o queijo Roquefort e o basco na França. As regiões de Aveyron, o País
Basco e a Córsega fazem parte dos terroirs ligados ao queijo de ovelha. Manchego, na
Espanha, Pecorino Romano e Ricotta, na Itália, e o famoso queijo Feta, na Grécia,
também são queijos dessa categoria, queridos por essas partes do sul da Europa.
O leite de ovelha contém muito mais gordura e matéria seca do que o leite de vaca, o
que o torna um produto raro, mas também mais rico em proteínas e lipídios. Portanto,
é mais necessário e mais interessante para a fabricação. Também é resistente à
contaminação durante o resfriamento, graças ao seu teor de cálcio muito maior.
A produção de leite e a fabricação de queijos são feitas sazonalmente, a fim de
respeitar o ciclo natural das ovelhas.
Queijos de cabra
A principal característica é que eles são feitos de leite de cabra. É, portanto, uma
família transversal, cujos membros podem ser encontrados em todas as famílias
apresentadas anteriormente.
Os queijos de cabra têm texturas e gostos muito diferentes. Dependendo da técnica de
fabricação, existem queijos de cabra em todas as famílias de massas. Há uma
infinidade deles, feitos como queijos frescos ou maduros, cinzentos ou não, em
diferentes formas — redondos, troncos, pirâmides, coração, discos… Entre os mais
famosos, encontramos Crottin de Chavignol, Rocamadour e Valençay.